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31.12.10 às 11:39

A “ecomusic” e os ativos ambientais

A música axé, que ainda sacode o país, pode ser substituída pela ecomúsica, por Eduardo Athayde
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O grupo Pink Floyd está plantando quatro florestas em diferentes países com o objetivo de sequestrar o carbono jogado na atmosfera pela produção do seu CD “Echoes”. Gil, Caetano, Milton Nascimento, Ivete Sangalo, Sandy e Júnior, Xuxa e Marlene Matos poderiam usar ainda mais a força de suas imagens para ajudar na educação ambiental, no reflorestamento da mata Atlântica e na preservação da Amazônia, do Pantanal, da caatinga e do cerrado. Eles podem ser ativos ambientais.

Desde 1950, as emissões de carbono pela queima de combustíveis fósseis quadruplicaram, chegando a 6,3 bilhões de toneladas em 2000. Hoje, em um único dia, a humanidade joga na atmosfera mais gás carbônico do que os seus antepassados jogaram em um século.

A natureza, na visão econológica (social, econômica e ecológica integradas), é entendida também como capital. Os ativos ambientais são bens de valor quantitativo, já aceitos pela nova contabilidade ambiental. As florestas estão sendo destruídas porque são percebidas só pelo seu valor qualitativo. As águas, as florestas, os ventos, a energia solar, a biomassa, a reciclagem e o hidrogênio podem ter os seus valores quantificados, são partes ativas da ecoeconomia.

As cidades têm grande influência sobre o consumo excessivo de recursos naturais. Segundo um estudo do WWI (Worldwatch Institute), “as cidades ocupam cerca de 2% da superfície terrestre, mas contribuem para o consumo de 76% da madeira industrializada e de 60% da água doce”. Londres, por exemplo, requer uma área 58 vezes maior do que a que ocupa para obter alimentos e madeira para sustento de seus habitantes. Se o padrão dos londrinos fosse estendido ao resto das populações urbanas do mundo, seriam necessários três planetas Terra para sustentar a todos.

A humanidade gera anualmente cerca de 30 bilhões de toneladas de lixo -e, com esse lixo, potenciais negócios. O setor mundial de reciclagem hoje processa mais de 600 milhões de toneladas de materiais anualmente, fatura US$ 160 bilhões/ano e emprega mais de 1,5 milhão de pessoas. Nos EUA, a refabricação já representa US$ 53 bilhões anuais, proporcionando cerca de 480 mil empregos diretos -o dobro do número dos empregos da indústria do aço.

O vapor de água quente das termelétricas -antes despejados nos rios- aquece 70% dos edifícios de Copenhagen, que reutiliza ainda as águas de pias e chuveiros para regar jardins e pomares domésticos. Na maioria das cidades, a água tratada, cara, ainda é usada nas descargas e na lavagem de veículos e pisos. A escassez crescente de água para irrigação pode reduzir em até 10% o suprimento mundial de alimentos.

“Agricultores e pecuaristas nos EUA estão descobrindo que possuem não apenas a terra, mas também os direitos eólicos que acompanham a sua propriedade”, afirma Lester Brown, fundador do WWI. Um fazendeiro no Estado de Iowa que arrenda um quarto de acre de milho à concessionária local para instalação de uma turbina eólica pode ganhar US$ 2.000 por ano em royalties. Num ano bom, essa mesma área pode produzir US$ 100 dólares de milho.

Segundo a American Wind Energy Association (Associação Americana de Energia Eólica) o custo por quilowatt/ hora da eletricidade eólica caiu de US$ 0,38, no início da década de 80, para de US$ 0,03 a US$ 0,06, hoje. E a geração da energia eólica subiu vertiginosamente.
Mapeando o vento, um ativo ambiental, o Ceará começa a usar a sua força natural para gerar energia com turbinas eólicas. Os cearenses podem também contabilizar, entre os seus muitos ativos, Tom Cavalcante, Chico Anysio e Renato Aragão. Como exemplos, eles podem ajudar a educar para o desenvolvimento e o consumo sustentáveis.

Os negócios ecorresponsáveis, como os do Pink Floyd, expandem-se em todo o mundo. Enquanto os “green funds” (fundos verdes) destacam-se em Wall Street, as florestas encolhem com o comércio mundial dos produtos do extrativismo florestal, movimentando um mercado que pulou de US$ 29 bilhões, em 61, para US$ 139 bilhões, 1998.

Em 500 anos, essa autofagia destruiu 93% da Mata Atlântica; em quanto tempo poderemos reconstituí-la, contando com o Protocolo de Kyoto e o apoio dos artistas, das empresas e da comunidade internacional? Numa visão global, essa é a nova questão.

Uma pesquisa da Embratur mostra que 95% dos turistas buscam o Brasil por causa dos recursos naturais. São hóspedes da natureza. As nossas florestas valem muito mais em pé do que do que deitadas. A proposta de trocar parte da dívida externa dos países em desenvolvimento por projetos de meio ambiente, reconduzida pelo ministro Sarney Filho e aprovada pelos 36 ministros presentes ao Fórum de Ministros do Meio Ambiente da América Latina e Caribe, realizado no Rio, ano passado, foi encaminhada para a reunião da cúpula internacional sobre Desenvolvimento Sustentável, na África do Sul, neste ano.

“A idade da pedra não acabou porque o mundo não tinha mais pedras. A idade do petróleo não acabará por não termos mais petróleo”, disse Don Huberts, da Shell Hidrogênio. A BP – Bristish Petroleum lançou a idéia de BP – Beyond Petroleum (além do petróleo) e a Royal Dutch Shell investe na Shell Hidrogênio. A Petrobrás, que já aprovou o embrião de um programa de energias renováveis, pode promover CDs de brasileiros comprometidos com programas de reflorestamento e preservação ambiental.

Somando as populações dos grandes centros urbanos costeiros, verificamos que mais de um terço da humanidade vive em apenas 100 km de costas, amontoada em cidades, e consome música entre os seus divertimentos prediletos.

A música axé, que ainda sacode o país, pode ser substituída pela ecomúsica, lançada nos trios elétricos, do Carnaval da Bahia para o mundo, em 2002, declarado pela ONU como Ano Internacional do Ecoturismo. A noção dos ativos ambientais está nos novos e respeitados índices como o Dow Jones Sustainability Indexes (índices de sustentabilidade da Dow Jones) que destacam a performance da sustentabilidade num circulo que beneficia corporações, investidores, o meio ambiente e a governança global. Estão, assim, ajudando a tear os fios da trama da vida, conhecendo e observando a natureza da natureza, da qual somos parte integrante e indissociável.

Eduardo Athayde é administrador, pesquisador, diretor da UMA (Universidade Livre da Mata Atlântica) e editor do Worldwatch Institute no Brasil. http://www.wwiuma.org.br/

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