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05.07.22 às 15:51

Akatu entrevista: Amanda Costa engaja a juventude a agir pela agenda climática

Embaixadora da ONU compartilha a sua trajetória como jovem negra ativista climática da periferia de São Paulo

Amanda Costa, 25 anos. Uma mulher negra, nascida na Brasilândia, na periferia de São Paulo, derrubou estereótipos e hoje atua pela agenda climática e pela melhoria da vida das pessoas. É fundadora e diretora-executiva do Instituto Perifa Sustentável, embaixadora da ONU, conselheira do Pacto Global e integrante da lista “Under 30” da Forbes. Como se não bastasse, ainda é criadora de conteúdo e atua como apresentadora do programa Tem Clima Pra isso, parceria entre Alma Preta Jornalismo e TVT. 

Em entrevista ao Akatu, Amanda compartilha a sua visão de mundo, sua atuação na agenda climática e contra o racismo e compartilha suas expectativas em prol de um futuro mais consciente e inclusivo.

1. Como você começou a atuar com a agenda climática? 

Quando eu entrei no curso de Relações Internacionais, iniciei um processo de pesquisa para entender como a crise climática se conecta com o mundo. Em paralelo, comecei a fazer algumas observações no meu bairro, entendendo que são as pessoas em maior vulnerabilidade que, consequentemente, vão sofrer os impactos dessa crise. Por conta desses estudos acadêmicos e análises, surgiu a oportunidade de representar a juventude brasileira na conferência de clima da ONU, na COP-23 na Alemanha, em 2017.

2. Como foi essa viagem e que questionamentos ela provocou em você? 

Durante a viagem eu conheci o Engajamundo, que trabalha para capacitar a juventude a ocupar espaços como tomadores de decisão. Após 6 meses, assumi a coordenação do Grupo de Trabalho de ODS e passei a coordenar jovens das cinco regiões brasileiras interessados em territorializar a Agenda 2030. Porém, um questionamento sempre ficava: “por que eu não vejo pessoas parecidas comigo nesse ambiente? Cadê a galera preta da quebrada?” Com essas dúvidas borbulhando, em 2019 eu passei em um edital internacional e criei o Perifa Sustentável

3. Qual é o propósito do Perifa Sustentável? 

O Perifa Sustentável tem três pilares: educomunicação, participação política e ação territorial. O trabalho consiste em ocupar e abrir as portas para outros jovens participarem e mostrar caminhos e ferramentas para mudarmos o sistema a partir da perspectiva da raça e do clima. Nosso intuito é dar voz para a juventude preta e periférica que, muitas vezes, é silenciada, oprimida e estereotipada. A minha mobilidade social só vai reverberar em uma luta coletiva quando trabalharmos em grupos. Existe muita potência nos territórios e está na hora de contarmos histórias das pessoas que estão na base, articulando e desenvolvendo outras possibilidades de futuro.  

“A minha mobilidade social só vai reverberar em uma luta coletiva quando trabalharmos em grupos”.

4. Como a crise climática impacta a periferia?

A periferia é um dos primeiros grupos a sentir os impactos da crise climática. Muitas vezes associamos esses assuntos como algo distante, mas não. Quando a gente vê a alteração do regime de chuvas, a favela inundando e as casas deslizando, notamos que a crise climática está potencializando impactos negativos. Outro ponto é o aumento da temperatura: os bairros periféricos são menos arborizados. Dados comprovam que nas favelas a temperatura é cerca de 2ºC maior que em bairros com árvores. E tem a questão da insegurança alimentar. 

5. Qual a importância da juventude no combate à crise climática? 

A juventude pressiona essa ruptura de transição de modelo econômico, social e ambiental. A gente vê ao redor do mundo jovens liderando movimentos e cobrando mudanças. A nossa geração está sofrendo com a “ecoansiedade”: eu tenho muitas amigas que não querem ter filhos porque não sabem qual planeta existirá daqui alguns anos. Ao mesmo tempo, é importante fazer um paralelo: que juventude é essa? Nosso papel é alcançar mais pessoas, ampliar o discurso e olhar para a crise climática como um desafio sistêmico que precisa ser debatido nas escolas, nas comunidades, em diálogo com a juventude. 

6. Que relação você pode fazer entre o que você acredita e o consumo consciente?

Quando temos consciência sobre o que estamos consumimos, seja roupas, alimentos ou até mesmo os conteúdos na internet, conseguimos ter uma maior nitidez para fazer escolhas mais intencionais, pois sabemos o impacto social positivo que podemos gerar a partir delas. A sustentabilidade e o consumo consciente contribuem com um futuro melhor pois nos dão mais informações sobre o que realmente está acontecendo no nosso planeta. Nos dão mais acesso à educação e ao conhecimento, para que possamos ter maior autonomia perante as nossas ações. 

“A sustentabilidade e o consumo consciente contribuem com um futuro melhor pois nos dão mais informações sobre o que realmente está acontecendo no nosso planeta”.

7. Como as pessoas podem desenvolver a consciência para se tornarem ambientalistas e antirracistas? 

É preciso entender onde está o fundamento dessa luta, estamos falando de alguns reforços sistêmicos e estruturais. E prefiro usar o debate climático, em vez do ambiental, pois é o clima que rege tudo isso. O segundo item é compreender se o seu papel é de protagonista ou apoiador. Se você é uma pessoa preta, entenda que o lugar de protagonismo e representação política também pode ser seu. Por séculos, nós, as pessoas pretas, escutamos que esse lugar não nos pertenciam. Fazer essas desconstruções também é uma possibilidade. Terceira e última reflexão: independente de qual o seu papel, puxe outras pessoas para o seu lado e traga esse despertar climático e racial para elas.  

8. Qual a sensação de conquistar tantos títulos com apenas 25 anos? 

Eu gosto de visualizar esse lugar como uma possibilidade de transformação, porque antigamente não se via uma mulher preta, de 25 anos, da Brasilândia, viajando como representante da ONU e trazendo essas demandas. Imagina o orgulho dos meus pais! Uma das coisas que faço é não ir sozinha. Eu não quero ser a única mulher preta da minha comunidade a sair na Forbes mas, a partir do momento que estou nesse lugar, posso apoiar e indicar outras a se levantarem, para que eu não seja a única pretinha. Acredito que eu sou um canal para que algo muito maior aconteça e é isso que importa e que precisa ser reverberado.

9. Qual a sua expectativa em prol de um futuro mais diverso, consciente e responsável?

A partir do momento que conseguimos nos engajar, ter apoios, mobilizar a comunidade e ter os recursos necessários para poder potencializar mudanças, conseguimos construir novas perspectivas. O futuro que eu quero construir é inclusivo, colaborativo, democrático, justo, consciente e abundante de recursos e de amor. Esse é o futuro que estou construindo e mobilizando a minha galera para tornar realidade. 

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