Visualize um reino de deslumbrantes cumes nevados, com leopardos e iaques vagando pelas montanhas. Com vastas florestas intocadas, onde o contentamento é mais valorizado do que o comércio, e um sábio rei que declara que a felicidade dos seus súditos é mais importante do que a produção econômica. Um conto de fadas? Um sonho da imaginação? Um reino virtual no Second Life? Nada disso. Estou falando de um lugar real, com pessoas verdadeiras – o reino de Butão, nas Himalaias.
O Butão tem recentemente capturado a atenção mundial pela sua inovadora mensuração do FIB (Felicidade Interna Bruta) em vez de PIB (Produto Interno Bruto). Por décadas o PIB, índice de progresso que soma todas as transações econômicas que acontecem numa nação, tem sido cada vez mais criticado, mais recentemente numa conferência da Comissão Européia em Bruxelas. O PIB não somente falha em contabilizar os custos ambientais, mas também inclui formas de crescimento econômico que são prejudiciais ao bem-estar da sociedade. Por exemplo, despesas com atendimentos médicos, crime, divórcio, e até desastres como Katrina, são computadas como um aumento do PIB!
O FIB, entretanto, vai um passo além. Ele situa a felicidade como o pivô do desenvolvimento. Desde Aristóteles, a procura da felicidade tem sido considerada a essência da vida. Até mesmo a Declaração da Independência dos EUA sacramenta essa busca como um direito fundamental de todos os cidadãos. E agora, em pleno século XXI, o rei do Butão, Jigme Singye Wangchuk – que no ano passado foi citado pela revista TIME entre as100 pessoas mais influentes do mundo – declarou que o FIB é o alicerce de todas as políticas de desenvolvimento do governo.
Fui convidada para participar da 3a Conferência Internacional em Felicidade Interna Bruta, na semana passada em Bangkok, Tailândia, para facilitar o debate acadêmico sobre os índices e políticas quanto ao FIB. Numerosos palestrantes enfatizaram que, enquanto o PIB baseou-se na crença de que a acumulação da produção econômica leva a um maior bem-estar, as pesquisas mostram o contrário. Após um certo nível de renda, o aumento da riqueza não é condizente com um correspondente aumento da felicidade.
O ex-ministro das relações exteriores da Tailândia, Dr. Surin Pitsuwan, lamentou, “O acelerado crescimento da Ásia nas últimas décadas alcançou o impressionante índice de 10% ao ano. Porém, perguntamos, ‘será que estamos mais felizes do que antes, com as nossas rendas aumentando cada vez mais rápido’? Muitos dizem que não”. De fato, quando olhei à minha volta em Bangkok, os graciosos pináculos dos templos tailandeses, com suas douradas telhas cintilando ao sol, foram obscurecidas pelos colossais shopping-centers que parecem gigantescas espaçonaves. “Nós aqui do sudeste da Ásia”, concluiu Pitsuwan, “apesar dos nossos milhões de rúpias, de ringgits e de bahts, nos sentimos mais inseguros com relação às nossas vidas, às nossas famílias, ao nosso futuro do que jamais sentimos antes”.
O Butão proveu uma alternativa. Os delegados butaneses na conferência atraíram atenção não apenas pelas suas distintas túnicas bordadas, mas também pela sua aura de júbilo interno, o que me lembrou a imperturbável jovialidade do Dalai Lama. As decisões políticas nesse país, de acordo com Dasho Karma Ura, diretor para o Centro de Estudos do Butão, são tomadas a partir dos indicadores do FIB, que são os seguintes: padrão de vida, saúde, educação, resiliência ecológica, bem-estar psicológico, diversidade cultural, uso equilibrado do tempo, boa governança e vitalidade comunitária.
Ele explica, “A renda não é buscada pelo seu bem em si, mas para aumentar a qualidade de vida, o que significa a obtenção da felicidade. Felicidade baseada na ética, em cultivar relacionamentos entre as pessoas e com a natureza. E também uma felicidade interior baseada na espiritualidade”.
Num mundo de aceleradas rupturas ecológicas, sociais e psicológicas, talvez os butaneses, com sua sabedoria dos Himalaias, tenham algo a nos ensinar. Que possamos alcançar a prosperidade em harmonia com o planeta sem perder a verdadeira fonte da felicidade: nossas conexões uns com os outros, com a Terra, e com o espírito dentro de nós.
(*) SUSAN ANDREWS é psicóloga e monja iogue. Autora do livro Stress a Seu Favor, ela coordena a ecovila Parque Ecológico Visão Futuro e escreve para a revista Época, onde este artigo foi originalmente publicado.
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