No último dia 17 de abril, o Conselho Nacional de Auto-Regulamentação Publicitária (Conar) suspendeu dois anúncios da Petrobras, de 2007, nos quais a empresa afirma ser socioambientalmente responsável. A medida atendeu a uma representação feita por organizações da sociedade civil e órgãos públicos, tendo como base os artigos do Código Brasileiro de Auto-regulamentação Publicitária que tratam, entre outros temas, de legalidade, respeito, caráter educativo, honestidade e apresentação verdadeira.
Um dos artigos utilizados para o julgamento prega o combate a anúncios que incentivam a poluição do meio ambiente. Pesou na decisão do Conar a alegação de que a Petrobrás não respeita uma resolução do Conselho Nacional do Meio Ambiente que define, como limite máximo, a quantidade de 50 partes por milhão (ppm) de enxofre no óleo diesel. Seu produto, segundo os acusadores, teria mais de dez vezes a presença desse elemento químico que, liberado nas emissões de automóveis, prejudica a saúde das pessoas.
A empresa comunicou que pretende cumprir compromisso estabelecido de disponibilizar diesel 50 ppm a partir de janeiro de 2009, data estipulada pelo Conama. E também que vai recorrer da decisão do Conar tão logo seja comunicada oficialmente. As organizações acusadoras festejam a decisão como “histórica” e “exemplar”, destacando que ela preserva o respeito ao conceito de sustentabilidade e estimula as empresas a adotarem práticas compatíveis com os seus discursos.
É certo que uma decisão como essa, por seu impacto e ineditismo, ainda dará muito pano para mangas. Certo é também o fato de que, ao final da contenda, todos sairão mais maduros, inclusive e, principalmente, a sociedade. Para o que nos interessa, o caso reabre uma discussão já tratada nessa coluna sobre os limites da comunicação da sustentabilidade. A ela vale a pena retornar para novas reflexões.
Um dos desafios que se impõem às empresas interessadas em comunicar seus compromissos socioambientais é a desconfiança das pessoas. Quase metade dos brasileiros, segundo pesquisa do Ibope (2007), considera as ações de responsabilidade socioambiental apenas uma estratégia de marketing. Leia-se: um entre dois cidadãos acha que as corporações fazem uso da propaganda de sustentabilidade para limpar a imagem, expediente que os americanos chamam de greenwashing.
A percepção prevalente é que as empresas agem de modo oportunista, supervalorizam as suas práticas, escondem os pontos vulneráveis e comunicam apenas o que as interessam porque entendem que o tema, crescentemente valorizado pela sociedade, confere valor aos negócios e á marca. Isso não é necessariamente uma verdade para 100% das empresas. Mas percepção é, por natureza, genérica. E mesmo as empresas que não se encaixam no figurino do imaginário coletivo, acabam, de alguma forma, prejudicadas pela desconfiança geral.
A que atribuir o manifesto pé atrás? Entre as várias razões possíveis, inclui-se a mão pesada do marketing. Tratado como atributo que impacta o modo como consumidores formam impressões sobre empresas e marcas, o tema sustentabilidade entrou para a agenda dos planejadores de marketing. Mais do que deveria. E de forma abrubpta. Por conseqüência, deixou-se contaminar pelo imediatismo, a simplificação e a crença na auto-suficiência da propaganda, três vícios característicos dessa área.
Na pressa de obter “resultados de imagem” — a rigor, uma das finalidades de sua ação– o marketing colocou o bloco da sustentabilidade na rua antes mesmo de as empresas realizarem a necessária lição de casa, isto é, mudarem práticas insustentáveis, reverem modelos de produção perdulários e desenvolverem cultura interna. Na maioria dos casos, isso ocorreu não por má fé. Mas por açodamento e despreparo. De olho numa suposta –e discutível– vantagem competitiva em relação á concorrência, o marketing saiu na frente sem ter dado á empresa o tempo de amadurecer a sua convicção sustentável junto com acionistas, funcionários, fornecedores, clientes e comunidades. Como convencer a sociedade por meio de um discurso sustentável se as partes interessadas, que conhecem a empresa mais de perto, ainda não estão plenamente convencidas das práticas sustentáveis que a empresa diz ter? A desconfiança é, portanto, compreensível.
Ao tentar enquadrar as ações socioambientais da empresa em um “posicionamento” criativo, escorando-se em slogans emocionais, imagens e metáforas bonitas, o marketing “vende uma idéia” mas não comunica tudo o que a empresa faz ou pensa fazer. Essa simplificação acaba sendo um subterfúgio para as que não tem o que mostrar. Mas pode também equivaler a um tiro no pé para as que, de fato, têm.
Ao contrário do que acreditam alguns profissionais de marketing, a propaganda não pode tudo. Nem resolve o jogo sozinha. Evidentemente, tem um papel importante no conjunto da comunicação. Mas vários estudos sugerem que as pessoas estão mais cada dia mais críticas em relação á mensagem auto-elogiosa e intencionalmente vendedora de feitos e realizações. Logo, no que se refere ao discurso institucional da sustentabilidade, deve-se observar cuidados em relação á forma, aos conteúdos e até mesmo á quantidade. Mais importante do que a propaganda, são as ações de comunicação dirigidas aos diferentes públicos de interesse. Bem planejadas, elas ajudam a construir a percepção de que a sustentabilidade está legitimamente associada a tudo o que a empresa faz, integrando-se á sua identidade. O único limite para a comunicação da sustentabilidade – como se vê – é a verdade.
* Ricardo Voltolini é publisher da revista Idéia Socioambiental e diretor da consultoria Idéia Sustentável. Este artigo foi publicado originalmente na revista Idéia Socioambiental.
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